Lélio Braga Calhau
Promotor de Justiça do Ministério Público do Estado de Minas Gerais
Professor de Direito Penal da Universidade Vale do Rio Doce − UNIVALE
Pós−graduado em Direito Penal e Direito Processual Penal Mestrando em Direito pela Universidade Gama Filho (RJ)
Promotor de Justiça do Ministério Público do Estado de Minas Gerais
Professor de Direito Penal da Universidade Vale do Rio Doce − UNIVALE
Pós−graduado em Direito Penal e Direito Processual Penal Mestrando em Direito pela Universidade Gama Filho (RJ)
Já tivemos oportunidade de discorrer em um pequeno texto sobre o
papel de José Ingenieros (01) junto à Criminologia e a Escola Positiva
de Direito Penal. Ingenieros, foi um dos grandes defensores das idéias
da Escola Positiva em nosso continente. Todavia, foi Cesare Lombroso,
médico italiano, que ocupou um dos papéis centrais, juntamente com Ferri
e Garofalo na Criminologia e na Escola Positiva de Direito Penal.
Fala−se
muito de Lombroso (1835−1909), em especial, no meio acadêmico, mas
pouco se conhece verdadeiramente do papel que teve para a Criminologia e
a Escola Positiva de Direito Penal. Lombroso estudou na Universidade de
Pádua, Viena, e Paris e foi posteriormente (1862−1876) professor de
psiquiatria na Universidade de Pavia e medicina forense e higiene
(1876), psiquiatria (1896) e antropologia criminal (1906) na
Universidade de Turim. Foi também diretor de um asilo mental na Itália.
As
idéias de Lombroso sustentaram um momento de rompimento de paradigmas
no Direito Penal e o surgimento da fase científica da Criminologia.
Lombroso e os adeptos da Escola Positiva de Direito Penal rebateram a
tese da Escola Clássica da responsabilidade penal lastreada no
livre−arbítrio. Com o despontar da filosofia positivista e o
florescimento dos estudos biológicos e sociológicos, nasce a escola
positiva. Essa escola, produto do naturalismo, sofreu influência da
doutrina evolucionista (Darwin, Lamarck); materialista (Buchner, Haeckel
e Molenschott); sociológica (Comte, Spencer, Ardig e Wundt);
frenológica (Gall); fisionômica (Lavater) e ainda dos estudos de Villari
e Cattaneo (02).
A Escola Positiva surgiu no contexto de um
acelerado desenvolvimento das ciências sociais (Antropologia,
Psiquiatria, Psicologia, Sociologia, estatística etc). Esse fato
determinou de forma significativa uma nova orientação nos estudos
criminológicos. Ao abstrato individualismo da Escola Clássica, a Escola
Positiva opôs a necessidade de defender mais enfaticamente o corpo
social contra a ação do delinqüente, priorizando os interesses sociais
em relação aos indivíduos (03).
De fato, o modelo proposto pelos
juristas que se aliaram ao movimento positivista respondia às
necessidades da burguesia no final do século XIX. Esta havia se apoiado
inicialmente em um Direito Penal Liberal que lhe havia permitido
neutralizar a nobreza, limitando, através de um órgão legítimo, seu
poder arbitrário. Agora, com o estabelecimento definitivo da nova ordem
burguesa, era necessário encontrar outros recursos penais que
assegurassem a superveniência da nova ordem social. A burguesia se
sentia ameaçada, não mais pela nobreza e seu poder arbitrário, senão
pelas classes perigosas, ou seja, pelas classes menos favorecidas que
levavam dentro de si o germe da degeneração e o crime. As idéias penais e
criminológicas dos positivistas coincidem com esta preocupação central
das novas classes privilegiadas e lhes proporcionaram um instrumento
prático e teórico para afugentar o perigo que para a estabilidade social
representavam os despojados (04).
Os positivistas rechaçaram
totalmente a noção clássica de um homem racional capaz de exercer seu
livre arbítrio. O positivista sustentava que o delinqüente se revelava
automaticamente em suas ações e que estava impulsionado por forças que
ele mesmo não tinha consciência (05). Esta corrente de pensamento
generalizou−se, exultante, a convicção, em um primeiro momento,
industrialista e, logo a seguir, capitalistas, do progresso linear do
saber humano, através de ciências que se entendiam quase como religiões
laicas, capazes de explicar, prever e manipular todos os fenômenos da
vida. O positivismo está estreitamente ligado à busca metódica
sustentada no experimental, rechaçando noções religiosas, morais,
apriorísticas ou conceitos abstratos, universais ou absolutos. O que não
fosse demonstrável materialmente, por via de experimentação
reproduzível, não podia ser científico (06).
O ponto de partida
da teoria de Lombroso proveio de pesquisas craniométricas de criminosos,
abrangendo fatores anatômicos, fisiológicos e mentais (07). A base da
teoria, primeiramente foi o atavismo: o retrocesso atávico ao homem
primitivo. Depois, a parada do desenvolvimento psíquico: comportamento
do delinqüente semelhante ao da criança. Por fim, a agressividade
explosiva do epilético. Lombroso expôs em detalhe suas
observações e teorias na obra O Homem Delinqüente cuja primeira edição
apareceu em 1876, convertendo−o em celebridade. Em 1885, realizou−se em
Roma um Primeiro Congresso de Antropologia Criminal, e as teses e
propostas de Lombroso obtiveram grande sucesso e reconhecimento
científico. Esses dez anos transcorridos entre seu livro e o congresso
demonstraram a rapidez com que se alcançava o êxito científico nas
sociedades européias, ávidas por novidades, descobertas espetaculares e
gênios, à base de uma imprensa alimentada com os descobrimentos do fim
do século XIX (08).
Lombroso mudava o fundamento de sua teoria
segundo as investigações que realizava. Sua obra fundamental O Homem
Delinqüente, passara de 252 páginas em sua primeira edição a 1903
páginas em sua quinta edição de 1896 e 1897. A contribuição
principal de Lombroso para a Criminologia não reside tanto em sua famosa
tipologia (onde destaca a categoria do delinqüente nato) ou em sua
teoria criminológica, senão no método que utilizou em suas
investigações: o método empírico. Sua teoria do delinqüente nato foi
formulada com base em resultados de mais de quatrocentas autópsias de
delinqüentes e seis mil análises de delinqüentes vivos; e o atavismo
que, conforme o seu ponto de vista, caracteriza o tipo criminoso − ao
que parece − contou com o estudo minucioso de vinte e cinco mil reclusos
de prisões européias (09). A idéia de atavismo aparece
estreitamente unida a figura do delinqüente nato. Segundo Lombroso,
criminosos e não−criminosos se distinguem entre si em virtude de uma
rica gama de anomalias e estigmas de origem atávica ou degenerativa
(10).
Lombroso apontava as seguintes características corporais do
homem delinqüente: protuberância occipital, órbitas grandes, testa
fugidia, arcos superciliares excessivos, zígomas salientes, prognatismo
inferior, nariz torcido, lábios grossos, arcada dentária defeituosa,
braços excessivamente longos, mãos grandes, anomalias dos órgão sexuais,
orelhas grandes e separadas, polidactia. As características anímicas,
segundo o autor, são: insensibilidade à dor, tendência a tatuagem,
cinismo, vaidade, crueldade, falta de senso moral, preguiça excessiva,
caráter impulsivo (1).
Lombroso foi modificando seus postulados
nas edições sucessivas de sua obra e, por ela, se viu obrigado a
incorporar os resultados daquelas observações empíricas que justificam
suas mudanças de orientação. As correções que foi introduzindo não
alteravam o núcleo de sua teoria, ou seja, o postulado segundo o qual
existe uma diferença biológica entre o delinqüente e o não−delinqüente
(12). Carlos Alberto Elbert registra que, em muito pouco tempo,
diversas verificações médicas foram relativizando a validade das
descobertas de Lombroso, que teve de retificar constantemente suas
afirmações mais ousadas; assim, no princípio afirmou que entre 65% e 75%
do total de criminosos tendiam à classificação de natos, para depois
fixar essa quantidade em 40%, e finalmente em um terço. Terminou
atribuindo à epilepsia a causa da delinqüência, tese que também foi
refutada em pouco tempo (13).
As teorias deterministas de
Lombroso não encontraram apoio nos estudos desenvolvidos por seus
discípulos. Suas idéias não haviam se baseado em uma metodologia
rigorosamente científica (14).Lombroso morreu em 19 de outubro
de 1909, em Turim, Itália. NOTAS DE FIM ALBERGARIA, Jason. Noções de
Criminologia. Belo Horizonte, Mandamentos, 1999, p. 131. ALBERGARIA, op.
cit, p. 131−132. BITENCOURT, Cezar Roberto. Manual de Direito Penal,
Parte Geral, São Paulo, 2000, p. 52.
CALHAU, Lélio Braga.
Criminologia positiva e a obra de José Ingenieros. Belo Horizonte,
Jornal do Sindicato dos Promotores e Procuradores de Justiça do
Ministério Público do Estado de Minas Gerais, Junho de 2002, p. 03.
Disponível também na internet: http://w.ibccrim.org.br e
http://w.pgj.mg.gov.br.
ELBERT, Carlos Alberto. Manual Básico de Criminologia. Tradução de Ney Fayet Jr. Porto Alegre, Ricardo Lenz, 2003, p. 54.
ELBERT, op. cit, p. 56. ELBERT, op. cit, p. 57.
GARRIDO,
Vicente; STANGELAND, Per; REDONDO, Santiago. Principios de
Criminologia. 2a ed, Valencia, Tirant lo Blanch, 2001, p. 252.
MOLINA, Antonio García−Pablos de; GOMES, Luiz Flávio. Criminologia, 4a edição, São Paulo, RT, 2002, p. 191.
MOLINA,
Antonio García−Pablos. Tratado de Criminología. 2ª ed, Valencia,
Tirant, 1999, p. 381.
PRADO, Luiz Régis. Curso de Direito Penal
Brasileiro, Parte Geral, São Paulo, RT, 1999, p. 47.
RABUFFETTI,
M. Susana Ciruzzi de. Breve ensayo acerca de las principales escuelas
criminológicas. Buenos Aires, Fabián J. Di Placido, 1999, p. 35.
ROMERO, Gladys Nancy. La evolución hacia una criminología radical. Buenos Aires, Fabián J. Di Placido, 1999, p. 89.
ROMERO, op. cit, p. 57−58.